1 de out. de 2008

ERIK - X Capítulo


“Caro amigo Erik,
Esta carta tem por função tranqüilizá-lo a respeito do desenrolar de nossos planos. Tudo correu exatamente como planejamos. “Você” já está morto e enterrado em Paris. Maiores detalhes, eu fornecerei pessoalmente em nosso próximo encontro em Londres. Sinta-se liberado para iniciar a procura de um local para nossa nova loja e de uma casa para morarmos. Só lhe peço que ache uma casa com mais cômodos que a de Dover, pois pretendo levar adiante o plano de levar minha irmãzinha para morar comigo.
Espero que esta o encontre bem de saúde...Ao contrário do “monsieur” que deixei em Paris em seu lugar.
Um abraço, de seu amigo
Paul”

Sempre brincalhão este Paul. Finalmente, as notícias que tanto esperara. Apenas continuava curioso para saber como tudo tinha acontecido. Será que ele falara com Annie? Teria visto Christine? Como ela devia estar? Provavelmente, linda como sempre.
Será que continuava cantando?
Melhor não pensar mais nisso. Deveria agradecer por estar livre de meu confinamento naquele hotel de terceira classe. Poderia caminhar pela cidade, fazer um reconhecimento dos lugares e começar a procurar um lugar para morarmos e outro para a nova joalheria.
Ainda estava apreensivo de como seria recebido pelos londrinos com meu visual peculiar. Por isso, aproveitei as horas intermináveis em que fiquei naquele hotel, para criar um novo disfarce. Acabei optando pela máscara da face direita, que parecia o que melhor cobria meu defeito. A única diferença é que a fiz em cor neutra, de forma a ser mais discreta. Não queria chamar tanto a atenção ao andar pelas ruas. Assim, dei a ela uma cor que se assemelhava à cor da pele. O chapéu e roupas discretas complementariam meu traje. Meu inglês melhorara bastante com as aulas dadas por Paul. Assim, sentia-me um pouco mais seguro.
Londres fervilhava naqueles dias de início da primavera. Carruagens, pessoas passeando e conversando animadamente pelas ruas. Idéias e inventores pululavam por ali. Era o ano de 1872. O Tâmisa exalava um cheiro horrível, mas o Parlamento erguia-se magnífico às suas margens. A obra de reconstrução, depois do incêndio de 1834, havia sido concluída somente há 2 anos. Quanto tempo a Ópera de Paris levaria para ser reconstruída? Sentia uma certa nostalgia ao andar por aquelas ruas, lembrando de Paris, por onde passeava, geralmente à noite ou, muito bem disfarçado, durante o dia.
Durante minha caminhada, chamava um pouco a atenção. Era difícil para uma pessoa de minha estatura, de quase 1.90 m, passar desapercebida, principalmente quando esta pessoa tinha metade do rosto coberto por uma máscara e usava um chapéu de abas um pouco mais largas que as ditadas pela última moda.
Conforme as informações obtidas no hotel, resolvi ir até Mayfair, onde o comércio mais requintado se encontrava. Fiquei sabendo que os membros da corte e da sociedade costumavam fazer suas compras naquela área. Assim, comecei minha procura de um local mais favorecido para abrir nossa joalheria. Depois de caminhar a manhã inteira, a sorte me sorriu ao descobrir um pequeno armarinho, na Bond Street, que estava sendo colocado à venda, pela esposa do falecido dono, por um bom preço. Só não fechei o negócio na mesma hora, pois queria a concordância de Paul. Ele deveria chegar em breve, segundo sua carta. Dei um sinal em dinheiro à viúva, para que ela garantisse minha preferência na compra. Esperava que Paul não demorasse muito a chegar, pois não confiei muito no olhar de cobiça e avidez da senhora. A minha impressão foi de que ela venderia para o primeiro que chegasse com o valor pedido, não importando se eu dera o sinal ou não. Ela havia passado o tempo todo a me observar, com olhos miúdos e assustados, coisa com a qual eu já estava acostumado. Ficou consternada quando, depois de vencer a curiosidade e perguntar qual o motivo da máscara, lhe disse que havia ferido meu rosto em batalha no México, lutando por Napoleão III., em 1865.
_ Oh, mas lutou tão jovem e tão longe daqui. Pobre rapaz – Foi o comentário da velha senhora.
Já estava começando a achar divertido aquele comportamento das pessoas. Era curioso pensar porque um ferimento de guerra era menos aterrorizante que um defeito de nascença?
Após as despedidas e promessa de retorno o mais breve possível para realizar a compra, segui a caminhar nas redondezas, em busca de uma residência.
Nada mais consegui naquele dia, mas já estava satisfeito.
Ao chegar no hotel, qual não foi minha surpresa ao encontrar Paul, todo sorridente, vindo em minha direção, abraçando-me efusivamente.
_ Então, meu querido amigo, aproveitando a liberdade nas ruas londrinas?
_ Que bom revê-lo, meu caro. Estava sentindo falta de nossas conversas. Não esperava você tão cedo. Recebi a sua carta ontem.
_ Pois aqui estou eu! Você já jantou?
_ Não, ainda não.
_ Que tal comemorarmos a sua nova vida e a minha chegada em grande estilo? Estava conversando com o nosso amigo ali – e apontou para o recepcionista do hotel – e ele me disse que logo ali em Convent Garden, tem um ótimo restaurante, freqüentado pela sociedade e membros da realeza. O que acha? Vamos cometer esse excesso? Só hoje?
Não havia como resistir àquele sujeito. Ele parecia estar eternamente de bem com a vida. Esperava que aquilo fosse contagioso.
_ Você acha conveniente eu ficar mostrando-me por aí? Não é muito cedo?
_ Qual nada! Precisamos conversar. E você sabe que eu não consigo pensar de barriga vazia.
_ Está bem, Paul. Já que você insiste...
_ Deixa de ser pessimista, Erik. Esqueça o passado... Ele foi enterrado nas profundezas de uma certa Ópera.
Seguimos para a rua Maiden Lane, em Convent Garden.

Fomos recebidos com frieza e desconfiança pelo maitre do “Rules”. Não estávamos vestidos adequadamente para o jantar em restaurante tão distinto. Porém, bastou Paul colocar uma gorda gorjeta no bolso do nobre senhor, para que ele nos arranjasse uma mesa. Claro que era uma mesa discretamente colocada nos fundos do salão , mas podíamos ter uma bela visão da “fauna” que estava presente por lá. Até chegarmos às nossas cadeiras, sentimos os olhares de todos a dissecar-nos, como se fôssemos subespécies da raça humana. Era uma apreciação semelhante a que eu sofria em Paris, quando fazia minhas curtas aparições. Senti um leve arrepio. Não era uma lembrança agradável. Pensei que a tinha deixado para trás, mas havia me enganado. Paul carregava um sorriso irônico e discreto nos lábios, andando de cabeça erguida, em frente. Quando sentamos, quase explodiu em uma gargalhada. Teve que por a mão sobre a boca para não rir alto.
_ Erik, não precisa ficar com este ar preocupado. São um bando de almofadinhas, acompanhados por damas esnobes e insatisfeitas. Não dê atenção a eles.
_ Não se preocupe comigo. Eu estou bem. Mas, por favor, conte-me como foi a sua viagem. Conte todos os detalhes do meu funeral e das pessoas que o acompanharam.
_ Já sei. Quer saber de sua Christine.
_ Ela nunca foi minha! – falei com irritação, pelo termo usado por Paul, em tom um pouco alterado, que fez as pessoas das mesas mais próximas olharem para nós.
_ Calma, amigo. Perdão. Não sabia que a situação era tão séria.
_ Desculpe, Paul. Não queria gritar com você, mas ela é uma parte importante do meu passado que eu quero esquecer. Na verdade, é por causa dela que estou nesta situação atual.
_ Sinto muito, Erik. Mas, vou lhe contar como tudo se passou.
Neste momento, o garçom veio tirar nossos pedidos. Assim que ele retirou-se, meu amigo iniciou o relato minucioso de sua aventura.

Um comentário:

Lucy disse...

É, apesar de poder sentir-se um pouco mais aliviado com a notoriedade de sua suposta morte, a saudades de Paris, o teatro, Christine, os planos que sonhou e não poderiam mais serem executados... tudo, por certo, causava uma grande dor ao Erik.

Mas o importante é que poderia tentar recomeçar sua vida, já que a antiga não tinha mais razão de persistir.

E agora encontrara um bom amigo, alguém que o estava ajudando a romper momentos tão doloridos.

Ah, mas se fosse comigo, eu continuaria com um estilo mais discreto, sem ir a lugares públicos, acho que sou mesmo medrosa, iria levar uma vida bem pacata.

Tadinho do Erik, se alterou porque a Christine nunca foi dele... Mas eu poderia agradá-lo: vem pra cá, Erik, sou sua!!!
PS Se a Pati vê isso, vai me matar!!! (rsrsrsrs)
Beijinhos...